Fingerprinting, nova oportunidade ou um retrocesso na privacidade?

Em dezembro passado, a Google anunciou uma mudança de política que gerou reações tanto positivas como negativas. A partir de 16 de fevereiro, a Google deixará de proibir o uso de técnicas de fingerprinting por parte das empresas que utilizam os seus produtos publicitários.

O fingerprinting identifica dispositivos combinando vários sinais numa única identificação digital, como o tamanho do ecrã, tipo de navegador, sistema operativo, nível de bateria, configuração de idioma, resolução do ecrã, complementos do teclado, endereço IP e centenas de outros pontos de dados.

Em 2019, Justin Schuh, Diretor de Engenharia do Chrome na altura, descreveu o fingerprinting como uma técnica "opaca" e afirmou que a Google planeava bloqueá-lo de forma mais agressiva. Segundo Schuh, ao contrário dos cookies, os utilizadores não podem apagar o fingerprinting nem controlar como esta informação é recolhida.

No entanto, numa reviravolta inesperada, a Google flexibilizou a sua posição. Um porta-voz da empresa explicou que esta mudança reflete o desenvolvimento de "novas tecnologias de melhoria da privacidade que mitigam riscos e apoiam o surgimento de novos canais como a CTV". Agora, a Google permitirá o uso do fingerprinting desde que os dados sejam geridos de forma segura e responsável.

Oportunidades, mas também críticas

O setor publicitário recebeu o anúncio com entusiasmo. “Esta atualização abre mais oportunidades num espaço fragmentado, respeitando a privacidade do utilizador”, comentou Jon Halvorson, Vice-Presidente Global de Experiência do Consumidor e Comércio Digital na Mondelēz, ao AdExchanger. “Permitir medições responsáveis que protejam a privacidade”, acrescenta Leigh Freund, Presidente e CEO da Network Advertising Initiative. Por sua vez, Tony Katsur, CEO da IAB Tech Lab, afirmou que esta política “melhorará as experiências do consumidor ao mitigar os riscos de privacidade”.

No entanto, segundo o AdExchanger, os defensores da privacidade criticaram a medida. Stephen Almond, Diretor Executivo de Riscos Regulatórios do ICO, classificou a mudança como “irresponsável” e alertou que as empresas não têm “liberdade total para usar o fingerprinting como quiserem”.

É possível que o fingerprinting seja legal e transparente?

Legalmente, os IDs usados no fingerprinting, como endereços IP, são considerados dados pessoais segundo muitas leis de privacidade, de acordo com Daniel Rosenzweig, advogado especializado em privacidade da DBR Data Privacy Solutions.

Embora, teoricamente, o fingerprinting pudesse ser implementado de forma transparente, na prática é quase impossível, afirmou Cillian Kieran, CEO da Ethyca. “O fingerprinting baseia-se na opacidade: recolhe dados de forma silenciosa, sem que o utilizador tenha conhecimento”, explicou o especialista. Alcançar a transparência exigiria uma reavaliação completa de como é implementado e de como afeta a experiência do utilizador.

“O fingerprinting é um atalho para manter o status quo do rastreamento publicitário. Se as pessoas consentissem ser rastreadas de forma informada, o fingerprinting seria desnecessário”, conclui Arielle Garcia, Diretora de Operações da Check My Ads.

Enquanto a Google argumenta que a sua mudança de política permitirá um equilíbrio entre privacidade e eficácia publicitária, o uso do fingerprinting continua a ser tema de debate. Para alguns, a medida reflete uma evolução necessária; para outros, é um retrocesso na proteção dos direitos dos utilizadores.