Os SSPs apostam no curation, mas os publishers receiam perder autonomia

Os SSPs estão num ponto de inflexão. Tradicionalmente, atuaram como a conexão entre anunciantes e publishers, mas o ecossistema programático está a evoluir rapidamente, forçando-os a reinventar-se. A nova aposta do setor é a “curation”, uma estratégia que agrupa pacotes de espaços publicitários (inventário) com base em temáticas ou audiências específicas, permitindo que os anunciantes os comprem diretamente através de Deal IDs.

À primeira vista, esta estratégia parece oferecer uma solução equilibrada: os anunciantes obtêm um targeting mais preciso, os publishers desbloqueiam novas vias de monetização e os SSPs encontram um elemento diferenciador competitivo. No entanto, os problemas estruturais do modelo começaram a emergir, reacendendo preocupações sobre transparência, qualidade do inventário e perda de controlo por parte dos publishers.

O dilema dos SSPs e o risco para os publishers

Para que a curation funcione, os SSPs precisam de combinar dois tipos de inventário: premium e long tail. Os publishers premium, com conteúdo de alta qualidade e forte procura publicitária, são a pedra angular dos pacotes curados, garantindo atratividade e legitimidade para os anunciantes. Entretanto, os publishers de menor qualidade (mais focados em volume) completam o inventário, muitas vezes incluindo sites categorizados como Made-for-Advertisers (MFA).

De acordo com a Admonsters, este modelo apresenta um desafio: os anunciantes estão cada vez mais equipados com ferramentas para identificar inventários de baixo desempenho. Se perceberem que a sua verba está a ser investida em conteúdo de qualidade inferior, é provável que rejeitem esses pacotes. Como resposta, os SSPs terão de modificar constantemente os seus pacotes, eliminando o inventário menos valioso para tentar manter a confiança dos compradores.

Este ciclo faz lembrar as práticas das antigas Ad Networks, onde a falta de transparência e a mistura de inventários premium com conteúdo de baixa qualidade levaram a uma crise de confiança na indústria.

Para os publishers, a curation representa uma ameaça à sua independência. Ao delegar a criação desses pacotes aos SSPs, perdem o controlo sobre a venda do seu próprio espaço publicitário, o que pode resultar em CPMs mais baixos e na canibalização de acordos diretos com anunciantes.

Além disso, se os publishers de topo começarem a notar uma desvalorização do seu inventário (devido à inclusão em pacotes com inventário menos qualificado), poderão optar por vender a sua publicidade através de acordos diretos com os DSPs, excluindo os SSPs do processo.

A visão dos anunciantes: transparência e controlo em risco

Os anunciantes procuram transparência na supply chain e a capacidade de aplicar os seus dados first-party de forma eficiente em todos os canais. No entanto, a curadoria dentro dos SSPs pode dificultar esses objetivos ao criar novos silos de dados e reduzir a capacidade dos compradores para executar campanhas multicanal de forma eficaz.

A isto soma-se a falta de clareza sobre os termos económicos dos pacotes curados. Muitos anunciantes desconhecem que percentagem do seu investimento é realmente direcionada para a compra de media e quanto fica nas mãos de intermediários, o que mina a confiança no modelo.

O futuro não passa por adicionar mais camadas de intermediação, mas sim por uma maior alinhamento entre anunciantes e publishers. Grandes empresas como a Disney já estão a explorar modelos alternativos, apostando em integrações diretas com DSPs através de iniciativas como DRAX e Bridge ID.

Os SSPs tentaram vender a estratégia de curation como a próxima grande inovação na programática, mas, no seu cerne, parece ser apenas um reaproveitamento de um modelo que já revelou falhas no passado. Se continuarem a misturar inventário premium com opções menos atrativas, correm o risco de alienar os seus melhores parceiros e frustrar os anunciantes.

Num mercado onde a transparência e a eficiência são prioridades crescentes, a grande questão é: será que a curation dos SSPs é realmente a solução de que a indústria precisa, ou apenas um remendo temporário que pode acabar por comprometer o sistema a longo prazo?

Ad TechMarta Fonsecacuration, SSPs, publishers