Publicis Groupe mantém o seu crescimento apesar da incerteza internacional
Numa economia internacional abalada por tensões comerciais, inflação persistente e a ameaça de uma recessão, o CEO do Publicis Groupe, Arthur Sadoun, transmitiu recentemente uma mensagem de confiança moderada ao apresentar os resultados do primeiro trimestre da empresa. Apesar do clima de incerteza, a multinacional francesa registou um crescimento anual de 4,9% e um aumento de receitas de 9,4%, o que lhe permite manter a previsão de crescimento anual entre os 4% e os 5%.
Segundo Sadoun, este desempenho não reflecte a tendência geral do sector, mas sim a estratégia diferenciadora do Publicis: um forte investimento em dados e identidade digital, e uma estrutura organizativa pensada para entregar resultados de negócio tangíveis aos clientes, mesmo em tempos difíceis.
“Os nossos clientes, tal como nós, estão habituados a lidar com a incerteza: já passámos pela pandemia, pela guerra, pela inflação... Sabem que, se deixarem de investir, perdem quota de mercado que depois é muito difícil recuperar. Por isso, diria que estão cautelosos, mas também muito competitivos”, afirmou o CEO.
Num contexto marcado por tarifas impulsionadas pela administração Trump, pressão sobre as margens e maior escrutínio financeiro sobre os orçamentos de marketing, os anunciantes adoptam uma postura de “esperar para ver”. Não reduziram os seus orçamentos, mas também não os aumentaram.
Ainda assim, a necessidade de defender ou ganhar quota de mercado obriga a manter alguma actividade publicitária. Isto traduz-se em decisões mais controladas, exigência de resultados mensuráveis a curto prazo e maior pressão sobre os meios de performance e criatividade de resposta rápida.
Os resultados regionais da Publicis refletem este equilíbrio: América do Norte e Ásia-Pacífico cresceram 4,8%, a Europa ficou para trás com 2,7%, enquanto a América Latina e outras regiões emergentes registaram crescimentos de dois dígitos. O melhor mês do trimestre foi março, o que sugere que ainda há impulso no investimento publicitário, embora com maior cautela. “Mesmo num ambiente volátil, os nossos clientes continuam a investir. O desafio está em provar que cada euro investido gera retorno”, comentou Sadoun.
Dados, identidade e meios conectados: a aposta da Publicis
Um dos pilares desta resiliência tem sido o investimento sustentado em dados e tecnologia. Desde a aquisição da Epsilon em 2019 até à recente compra da Lotame, a Publicis construiu uma rede de identidade digital que, segundo a empresa, tem visibilidade sobre 91% dos adultos ligados à internet no mundo. Este ecossistema permite segmentar, activar e medir campanhas com maior precisão, ligando directamente o marketing aos resultados de negócio.
“Dizemos aos nossos clientes: não nos julguem apenas pelas campanhas, mas sim pelos resultados que geramos. Construímos o sistema de meios mais conectado da indústria, desde paid media até meios próprios, e isso optimiza o investimento”, afirma Sadoun. Esta visão contrasta com a de concorrentes como a WPP, que recentemente adquiriu a plataforma de clean rooms InfoSum. Para Sadoun, clean rooms sem uma base sólida de identidade são “prateleiras vazias” incapazes de oferecer insights verdadeiramente accionáveis.
Publicis Sapient
Enquanto as unidades de meios e inteligência criativa da Publicis continuam dinâmicas, a Publicis Sapient, a sua divisão de transformação empresarial, registou uma quebra de receitas no trimestre. Sadoun atribuiu esta queda a uma pausa temporária no investimento em capital (CapEx) por parte dos clientes, que preferem aguardar maior visibilidade macroeconómica antes de avançar com projectos de transformação digital. No entanto, o CEO mostra-se confiante na recuperação, argumentando que a adopção de agentes de IA e automação favorecerá modelos mais ágeis e económicos, onde a Sapient tem vantagem face a consultoras de TI mais tradicionais e dependentes de mão-de-obra intensiva.
Um dos principais factores que reforçam o optimismo da Publicis é o seu recente sucesso na conquista de novos negócios. Em 2025, a agência ganhou a cobiçada conta de meios da Coca-Cola na América do Norte, um contrato que reforça a sua capacidade de competir ao mais alto nível. Este feito soma-se a um excelente 2024, em que as suas agências Starcom e Zenith lideraram o ranking de novos negócios a nível internacional com 1.400 e 1.200 milhões de dólares ganhos, respectivamente (excluindo renovações), segundo a COMvergence. “Graças à vitória da Coca-Cola, estamos bem posicionados para cumprir a nossa contribuição para o crescimento orgânico em 2025”, explica Sadoun.
Além disso, observa-se uma evolução na forma como se ganham novos clientes. Cada vez mais anunciantes optam por trabalhar com a Publicis sem passar por processos formais de licitação (RFP), iniciando colaborações-piloto para “testar capacidades” antes de um compromisso de longo prazo. Esta tendência reflecte uma transformação na forma de fazer negócios na indústria publicitária: menos burocracia, mais valor demonstrado desde o primeiro contacto.
Aquisições: estratégia calculada, não agressiva
A Publicis investiu 500 milhões de euros em aquisições desde o início de 2025, e 1.700 milhões de euros desde 2024. No entanto, não planeia acelerar esse ritmo, apesar das especulações sobre um novo ciclo de fusões e aquisições impulsionado pela política económica dos EUA. A volatilidade dos mercados, as oscilações nas bolsas e o contexto inflacionista exigem uma abordagem selectiva. “Temos um bom pipeline, mas continuamos muito cautelosos quanto a futuras aquisições. Toda a operação deve fazer sentido estratégico, ter uma integração simples e uma valorização coerente com o momento actual”, afirma Loris Nold, CFO da empresa.
O Publicis Groupe demonstra que, num ambiente volátil, a chave não está apenas em crescer, mas em crescer com estabilidade. Graças ao seu ecossistema tecnológico, disciplina financeira e foco em resultados tangíveis, a empresa consegue consolidar relações com clientes que procuram performance, precisão e resiliência. “Em tempos complexos, a diferença não está nas promessas, mas nos resultados. E nisso, os números falam por nós”, conclui Sadoun.