As políticas de privacidade da Apple geram controvérsia na Europa devido a uma possível vantagem competitiva

A Apple poderá enfrentar o seu maior desafio regulatório em anos, uma vez que a Autoridade da Concorrência de França está prestes a impor uma multa e a exigir a suspensão da sua política de AppTrackingTransparency (ATT) no país. A Alemanha também manifestou preocupações semelhantes, o que sugere que a medida poderá ter repercussões a nível da União Europeia.

Lançado em 2021, o ATT obriga as aplicações de terceiros no iOS a solicitarem permissão explícita aos utilizadores para rastrear a sua atividade para fins publicitários, afetando drasticamente a capacidade das empresas de realizarem target marketing. No entanto, os reguladores europeus argumentam que a Apple tem utilizado o ATT de forma discriminatória, beneficiando o seu próprio negócio publicitário ao continuar a recolher dados através dos seus próprios serviços sem estar sujeita às mesmas restrições.

Impacto económico e críticas à Apple

Um estudo realizado por investigadores da Northwestern, Columbia e UCLA estima que o ATT reduziu as vendas de comércio eletrónico entre 20% e 30%, prejudicando especialmente as pequenas empresas e marcas que dependem da publicidade em plataformas como a Meta. De facto, as empresas com uma forte dependência da Meta registaram uma queda de 39,4% nas receitas após a implementação do ATT.

O especialista em marketing digital Eric Seufert tem sido um dos analistas mais críticos do ATT e destacou que uma possível reversão parcial da política – como a harmonização do texto dos avisos de consentimento entre os anúncios da Apple e as aplicações de terceiros – já representaria uma vitória moral para a indústria publicitária.

Além disso, os críticos apontam para uma aparente hipocrisia da Apple: enquanto impõe restrições a terceiros, continua a recolher dados dos utilizadores nos seus próprios ecossistemas, incluindo Apple TV, App Store, Apple Music, Apple News e Apple Pay, justificando esta prática com o termo “personalização” em vez de “rastreio”.

Um precedente internacional?

Caso os reguladores europeus consigam impor restrições ao ATT, o impacto poderá estender-se a nível global. Nos EUA, o tema também poderá ganhar relevância com uma possível mudança de administração, uma vez que alguns especialistas sugerem que o Departamento de Justiça poderá considerar medidas semelhantes.

Para além do caso Apple, uma reversão do ATT poderia marcar um ponto de viragem na regulamentação da publicidade digital, impedindo que outras plataformas adotem estratégias semelhantes sob o pretexto da privacidade. Para as empresas de publicidade digital e anunciantes, isto significaria a restauração de um equilíbrio competitivo e a oportunidade de recuperar a eficácia do marketing baseado em dados.

Por agora, a indústria aguarda atentamente a decisão final dos reguladores franceses e alemães, que poderá representar um dos maiores reveses regulatórios da Apple na Europa.